quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Cartão de crédito longe de solução

A queda de braço entre a indústria de cartões de crédito e os comerciantes ainda está longe de chegar ao fim. Isso, apesar das recomendações que as equipes técnicas do Banco Central (BC), da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE) e da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (Seae) divulgaram ontem, depois de análise sobre essa forma de pagamento que não para de crescer no país. Os técnicos recomendaram que o credenciamento no país seja aberto, isto é, que possa ser feito por outras empresas, além da Mastercard e da Visanet; que o uso das máquinas e das redes que processam as operações seja compartilhado por todas as bandeiras; que os esquemas nacionais de cartões de débito se fortaleça; e que haja transparência na definição das taxas cobradas.

Há até a intenção para motivar o aumento da concorrência e da transparência. No entanto, na prática, as sugestões não contemplam boa parte das solicitações que os lojistas tinham feito com o objetivo de regulamentar o setor e diminuir custos, o que implica diretamente a redução dos preços dos produtos para os consumidores. "As propostas foram limitadas", observa o presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH), Roberto Alfeu. Além do mais, não foi fixada nenhuma data para que as alterações entrem em vigor.

Alfeu lembra que os lojistas queriam que o BC fosse o agente regulador dessa indústria de cartões. "Mas, por enquanto, não vai mudar quase nada", afirma. A única medida que já deve entrar em vigor é a do uso compartilhado das máquinas que fazem as transações. Isso pode diminuir custos. Vale lembrar que os lojistas pagam um aluguel mensal entre R$ 80 e R$ 120 por terminal. Se têm quatro máquinas, como as operadas pela funcionária da Alessa Gelato e Caffè Eliane Soares dos Santos, pode haver uma economia para o comerciante. A sócia da sorveteria, Vanessa Drumond, afirma que, se houver apenas um terminal capaz de registrar todas as vendas no cartão de crédito, vai ser muito melhor. "Vai facilitar para nós e para os clientes por diminuir os problemas que enfrentamos com a manutenção dessas máquinas, além de eliminar as taxas", afirma. Ela lembra que não dá para deixar de aceitar os cartões, forma de pagamento preferida por sua clientela. "É a vida moderna, os consumidores fazem questão", pondera.

Segundo o presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), Roque Pellizzaro Júnior, as recomendações divulgadas pelas equipes do governo representam um começo. No entanto, ele afirma que ainda resta muito para regularizar o setor. A expectativa é de que um relatório mais completo seja encaminhado ao presidente do BC, Henrique Meirelles; ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, e ao ministro da Justiça, Tarso Genro, nos próximos dias.

A Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) entende que as equipes técnicas do governo "analisaram com extremo rigor e cuidado as proposições do setor". Segundo a Abecs, as medidas são mais abrangentes do que as propostas iniciais apresentadas pela indústria, por isso, "ocorrerão alterações significativas nos atuais padrões de funcionamento e concorrência do setor." "O cronograma de implementação das medidas será definido pelas autoridades. Em paralelo, os reguladores estão discutindo outras medidas, que, depois de submetidas aos Ministros, terão encaminhamentos institucionais distintos, dependendo do escopo. O compromisso dos órgãos reguladores é com a adoção de medidas que aumentem a concorrência e a transparência, melhorem a governança e a segregação de informações e tornem a indústria de cartões de pagamento no Brasil mais eficiente sem afetar as condições de bom funcionamento do setor", informa a nota do BC.

SÓ BOA INTENÇÃO
O que os comerciantes queriam . Regulamentação da indústria de cartões de crédito no país; . Diminuição do valor pago pelo aluguel das máquinas, que hoje varia de R$ 80 a R$ 120; . Redução nas taxas cobradas por transação, que chegam a 5% do valor da compra; . Prazo menor para pagamento ao lojista do valor gasto pelo cliente com cartão. No Brasil, o dinheiro é repassado ao comerciante em 30 dias e na Argentina, por exemplo, o crédito é feito em sete dias; . Queda da porcentagem do valor da compra cobrado para antecipação do dinheiro, que varia de 3% a 5%; . Mais transparência; . Aumento da concorrência no setor; . Possibilidade de dar desconto aos clientes que pagam com dinheiro; . Diminuição nos juros cobrados dos consumidores no crédito rotativo (quando há atraso ou pagamento mínimo nas faturas), que chegam, em média, a 10,68% ao mês ou 237,93% ao ano.

O que o Banco Central recomenda:
- Abertura da atividade de credenciamento de comerciantes, que hoje é monopólio de empresas ligadas às bandeiras de cartão de crédito;
- Interação na operação de redes e de máquinas, ou seja, um terminal faria a operação de todos os cartões, independentemente das bandeiras;
- Maior transparência nas tarifas pagas pelos lojistas, que acabam sendo repassadas aos clientes;
- Fortalecimento de esquemas nacionais de cartões de débito;

CAUTELA NAS COMPRAS
O último trimestre de 2009 já começou, mas o consumidor parece ainda cauteloso em suas projeções para compras de fim de ano de bens duráveis, como automóveis e eletrodomésticos. Levantamento especial da Fundação Getúlio Vargas (FGV) revela que, em setembro, apenas 12,9% dos entrevistados em mais de 2 mil domicílios se mostravam dispostos a comprar mais produtos duráveis nos próximos meses. Embora seja uma participação relevante, foi o menor percentual para setembro nos últimos dois anos. Relatório trimestral de inflação do BC referente ao segundo trimestre deste ano mostrou que, até março, o nível de endividamento das famílias chegou a 34,8% da renda anual dos últimos 12 meses. O aumento foi de 2,4 pontos percentuais em relação a igual período de 2008, o que pode desestimular compras mais caras.

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